Como a filantropia pode ser estratégica no enfrentamento dos desafios climáticos; leia artigo
A 28ª Conferência das Partes, a COP-28, que começa nesta semana em Dubai, nos Emirados Árabes, guarda uma expectativa importante: será a primeira na qual os países membros vão apresentar o balanço do que fizeram — e do que ainda precisam fazer — para cumprir as metas do Acordo de Paris.
Assinado em 2015, o acordo estabeleceu o compromisso global de limitar o aumento da temperatura do planeta, em relação à temperatura média pré-industrial a 1,5 °C.
Além de avaliar o resultado até agora do principal compromisso global para frear o aquecimento do mundo, assinado por 195 países, a COP-28 pode ter papel crucial na geração de mudanças regulatórias, legais, políticas e mercadológicas capazes de permitir o avanço concreto dos objetivos da agenda climática.
Com o tempo contado, já que o prazo é 2030, e diante de eventos extremos, como temperaturas recorde, secas históricas e enchentes, nunca foi tão urgente formarmos uma mobilização para alcançar as metas climáticas.
Um dos maiores nós desta agenda, a lacuna de financiamento para a transição já foi estimada: será necessário investir por ano US$ 4 trilhões em tecnologias limpas se quisermos neutralizar as emissões até 2050, e algo entre US$ 4 trilhões e 6 trilhões para alcançarmos uma economia de baixo carbono global.
Além das incertezas sobre como arrecadar os recursos necessários para garantir o futuro, há os acordos antigos ainda não cumpridos. Na COP-15, em 2009, países desenvolvidos se comprometeram a juntar um fundo de US$ 100 bilhões ao ano e transferir às nações em desenvolvimento até 2025. Isso foi há 14 anos e a meta ainda não foi cumprida.
Diante da urgência e do tamanho dos desafios, a filantropia global começa a responder ao chamado para uma maior mobilização e cooperação em torno do tema. Segundo o Funding trends 2023: Climate change mitigation philanthropy, relatório divulgado neste mês pela ClimateWorks, as doações filantrópicas para a mitigação das mudanças climáticas cresceram 12% em 2022, após darem um salto de 45% no ano anterior.
A série histórica acompanhada pelo relatório tem início em 2015. Apesar disso, o caminho ainda é longo: estima-se que menos de 2% do financiamento filantrópico seja dedicado a ações contra as alterações do clima.
A filantropia sozinha, claro, não tem recursos suficientes para resolver o problema do financiamento. No entanto, pode oferecer — e, em muitos casos, já tem oferecido — uma importante contribuição: garantir o espaço para a inovação.
Para apoiar essa “vocação” do capital filantrópico e tornar suas escolhas mais estratégicas, The Bridgespan Group lançou o estudo Winning on Climate Change, em que foram mapeadas e propostas três práticas para a filantropia climática apostar suas fichas na próxima década: investir em iniciativas que ainda estejam em estágios iniciais, mas possuem metas ambiciosas; apoiar e se unir às estruturas e atores já existentes; e apoiar leis e políticas públicas que possibilitem as mudanças estruturais que precisamos para avançar em pontos estratégicos da agenda.
As propostas foram pensadas a partir de todas as condições que a filantropia possui, não como limitantes, mas como especificidades que podem ser únicas entre os atores climáticos. Investir em projetos que miram em grandes objetivos, ainda em fase de incubação, por exemplo, é uma saída estratégica para os recursos limitados.
Fornecer flexibilidade financeira para organizações em estágios iniciais oferece a oportunidade de testar conceitos e a filantropia é um dos únicos atores com liberdade de fornecer capital de risco para incentivar e permitir a experimentação e criatividade. Uma vez que a aposta dá certo, pode ser escalonada e exponencialmente fazer diferença.
Para nós, brasileiros, a COP-28 será também um momento importante na preparação da COP-30, daqui a dois anos, e que terá a Amazônia, especificamente Belém, como sede. Convidar a filantropia mundial para agir na agenda climática e estar preparados para, juntos, fazermos escolhas de financiamento estratégicas — com a força que só a coletividade traz — é uma das nossas tarefas na construção desse caminho.
Renata Piazzon é diretora-geral do Instituto Arapyaú, cofacilitadora da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, integrante do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social Sustentável e conselheira do Gife